Uma parvoíce inventada pelos poetas provençais.
Achas que houve sempre amor?
Não houve! Em Creta não havia amor, na Babilónia não havia amor! Não? Havia o quê?
Traições. Traições e amizades sólidas.
Como é que isto vai acabar, meu Deus?
Ninguém se mova…
Eu não falo. Vamos ver quem é que aguenta o silêncio…
Shhh…! Silêncio! Silêncio!
Ele não aguenta! Beijo-a ou não?
Beija-me…
Eis o casal perfeito deste país em ruínas… o pai de família comido pela Marilyn Monroe, casado com a vaca leiteira dos executivos nacionais!»
«Fragmentos de uma "Happy Hour", para dois actores, fragmentos de um discurso/diálogo em eco/espelho que nos faça pela proximidade física o distanciamento necessário às leituras possíveis deste "braço de ferro", deste abraço/afecto, perdido na agonia do quotidiano. Espectáculo construído para um olhar atento da pulsação, do nó da garganta, dos corpos usados e famintos de conforto, numa batalha de palavras, emoções, que feitas em nome da verdade nos vai dando a observar e espero, a fazer sentir na pele, o infortúnio e o "peso" das vidas paralelas, no confronto com a natureza animal de cada uma das personagens e que talvez devido à passiva, insegura e repetitiva deriva delas, possamos desta vez e como diria Garrett "falar verdade a mentir".
Espectáculo de carrossel, placa giratória, bola de espelhos que se abre e fecha como uma doce e inquietante caixinha de musica.»
(Fraga, Jan09)
Choveu todo o santo dia. A noite, essa caiu lentamente, de forma suave mas determinada. Aquela noite prometia, senti-o desde o momento em que me telefonaste ao final da tarde. "Destrambalhas-me toda", disse-te logo sem perder a oportunidade para sorrir com o Coração. Seguimos viagem. Do meio do nada avistam-se dois corpos pequenos de mãos dadas, a andar pela Baixa à procura de um lugar para jantar. Que chuva tão fria, bolas... No entanto, a tua mão protegia-me dos males do Mundo, não me deixava cair nem tropeçar, nem perder o rumo... E ainda me aquecia a Alma.
A Trindade está "à pinha", voltam para trás. Bem, o Café do Chiado traz-nos sempre boas recordações, apesar do Mateus Rosé! Entraram tranquilos, escolheram o lugar. Tiram-se os casacos molhados e sentaram-se. Dizem-se piadas, contam-se histórias, trocam-se olhares, uns furtivos outros densos até. Os discursos e as conversas fluem naturalmente. Há palavras que nos beijam como se tivessem nome. Ainda assim, fica sempre tanto por dizer...
Escolhemos o camarão e quanto ao vinho não restam dúvidas. Pedimos o Rosé, Mateus Rosé. As borbulhas fazem-nos sentir cócegas na garganta mas, no final de cada trago, sente-se aquele misto de doce-amargo tão peculiar que nos aquece por dentro. Trocam-se as facas pelo meio. Oh pá, nunca te orientas! Eu falo demais e tu baralhas-te sem perder esse jeito engraçado e desengonçado de ser. Deixa... Não importa! As rugas no canto de cada um dos teus olhos e esse sorriso aberto cheio de segredos fazem de ti uma pessoa única. Já cá andas há muito tempo, you know...
Jantámos, preparámos o tabaco e saímos para a rua. Não me vou alongar sobre aquela triste ideia de pedir o CD que estava a tocar, apenas para confirmar se a Diana Krall estava a fazer um "falsete". Valeu-me de muito! Perdi mais uma aposta, lá terei de pagar um jantar num restaurante do qual nem o nome me queres dizer! Estava frio lá fora mas comigo veio a taça de vinho. Não quero que nos falte nada, bem sabes. Tu ensinas-me tanta coisa e eu mimo-te com tanto e com tão pouco (e, nesses momentos, não me falta nada, sabias?...). Para além disso, não há combinação mais perfeita do que tu, eu, uma taça de vinho, dois cigarros e chuva a cair. Disseste baixinho: «- Espertinha, a Menina...» E eu respondi-te, com aquela frase típica: «-Pois é, eu cá não brinco em serviço!».
Olha, olha! Chegaram mais dois! Temos companhia, boa gente. Gente tranquila, sem stress. Senti de novo aquela certeza de que a noite avançava no tempo e na hora certos. Trocam-se mais palavras, joga-se conversa fora descontraidamente. São quase onze da noite. Caminhamos a passos largos para não chegarmos atrasados ao Luso.
Estava ansiosa e cheia de curiosidade para ver esta peça. Inicialmente não podias mas acabaste por vir e por apreciar. Afinal, deixei-te gozar à vontade, enfiar-me os dedos no nariz e nas orelhas até que eu fico sem jeito. Fazes-me rir como uma Criança. Guardas-me um lugar na fila da frente, mesmo ao teu lado. Experimentas o meu licor, fumamos mais um cigarro e eu seguro no cinzeiro. O pano preto não sobe antes do primeiro acto. O cenário é ali mesmo, no centro de tudo. Os personagens encarnam a figura de todos nós. Revivemos sentimentos, momentos, situações e emociono-me. Os meus olhos querem saltar de tanto olhar para ela e para ele, como que a querer "sorver" cada palavra saída daquelas bocas e cada gesto e movimento daqueles corpos.
Quase sem saber o que me estava a acontecer (não, não era fruto do vinho e nem do licor), tu tocaste-me na mão. Foi com delicadeza e eu acarinhei-te de imediato, alegre, confusa mas grata. Recebo esse gesto pausadamente, sem pressa nenhuma. Aquele era o Momento. Nesse instante perfumado confirma-se que a noite, esta noite era mesmo especial. Sincronicidade, nada mais. O Universo revelou-se, deu-se a conhecer, e tu tocaste-me sem qualquer pudor. Por isso te recebi, assim mesmo, tão serena e orgulhosa, com toda a ternura. Estou de bem Comigo e com o Mundo. Apeteceu-me beijar-te enquanto me entregava a ti.
«Como é que isto vai acabar, meu Deus?
Ninguém se mova…
Eu não falo. Vamos ver quem é que aguenta o silêncio…
Shhh…! Silêncio! Silêncio!
Ele não aguenta! Beijo-a ou não?
Beija-me…»
http://br.youtube.com/watch?v=x6ToqVt68sE&feature=related